Segmento que cresce a dois dígitos por ano já há algum tempo, o mercado de fidelização é um oásis em meio ao cenário árido da economia brasileira. Apenas no primeiro semestre de 2019, as empresas do setor garantiram crescimento de 12,7% em comparação ao mesmo período do ano anterior. O número foi divulgado durante a abertura do 4º Fórum Brasileiro de Fidelização, ocorrido em setembro, em São Paulo, por Roberto Chade, presidente da Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização (ABEMF), e que cravou ainda a frase que tem virado mantra no setor: “Data is the new oil”.
A julgar pelos R$ 3,7 bilhões entrando em caixa somente nos primeiros seis meses deste ano – o faturamento bruto do setor em 2018 foi de R$ 6,9 bilhões -, os dados são mesmo o petróleo do século 21 para o mercado de fidelização. “Estamos assistindo a uma evolução grande com a chegada dos programas a novos mercados, com o aumento de empresas interessadas em serem parceiras, investimentos em tecnologias que melhoram processos de emissão e de resgate de pontos/milhas, assim como a análise de dados que torna os programas mais eficientes e relevantes”, disse Chade.
Tendências em fidelização no 4º Fórum
De fato, da indústria ao varejo, passando pela tecnologia e serviços, não há mercado que não tenha se dado conta da importância de conhecer seu público e comportamento, de forma a engajá-lo por meio de uma experiência eficiente e relevante. Engajamento e experiência, aliás, foram duas palavras bastante utilizadas pelos palestrantes do fórum. C-levels de empresas nacionais e estrangeiras palestraram para 400 representantes de grandes companhias, com apresentações e painéis sobre o panorama da fidelização no país e no mundo, legislação, novos mercados e as tendências em fidelização para o futuro.
Confira os destaques da cobertura do TSI que farão parte de nosso Podcast Engajadores, série de programas que irá ao ar a partir do dia 16 de outubro, com estas entrevistas exclusivas:
As ‘novas moedas’ para relacionamento
Sean Claessen, vice-presidente executivo de Estratégia e Inovação da agência canadense Bond Brand Loyalty, trouxe dados da pesquisa global feita em parceria com a Visa, The Loyalty Report ‘19. Tendo como base 55 mil consumidores, em mais de 20 mercados, com cerca de 900 programas de fidelidade de diversos setores, o relatório aponta que quase 75% das razões que motivam a satisfação de um participante estão ligadas à experiência vivenciada e à conveniência. O fator emocional impactando a jornada do cliente.
“Tempo é uma nova moeda em fidelidade”, exemplificou Claessen, ao abordar as novas tendências. “Acredito que o futuro do loyalty será em torno dessas new currencies embutidas na experiência do consumidor: economia de tempo, formas de reconhecimento, os ‘Es’ [engagement, ease, enjoyment] e, claro, personalização”. Sobre o Brasil, ele disse ver movimentos similares a mercados como Canadá e Reino Unido. “Como os de empresas aéreas que voltaram a tratar os programas de fidelidade internamente. No meu entendimento, muito daquela dinâmica está tomando forma aqui também”.
Construindo engajamento em B2B
Quem também abordou novos movimentos e mercados foi Antônio Serrano, fundador e CEO da Juntos Somos +, uma joint venture formada pela Votorantim Cimentos, Grupo Tigre e Gerdau Brasil. A empresa é o maior programa de fidelidade do varejo de construção do país e a maior plataforma de marketplace B2B do setor. De um universo de mais de 134 mil lojas, o Juntos Somos + conta com 55 mil estabelecimentos, além de 60 mil vendedores e outros 150 mil profissionais de obras participantes (pedreiros, pintores, encanadores) – e mais de 30 mil downloads do aplicativo para smartphone.
“Quando lançamos um piloto, em 2014, o objetivo era atender a quatro pontos: Melhorar o índice de fidelidade do público varejista; criar uma plataforma eficiente para gerar recompensas para os consumidores; profissionalizar um setor que precisava de maior desenvolvimento [a área de recompensas inclui cursos e capacitações]; e inteligência de informação – agora, quando lançamos um produto novo, conseguimos treinar milhares de vendedores em uma semana”. Hoje, o programa conta com 20 empresas participantes, tendo movimentado R$ 5 bilhões em 2018, e com objetivo de transformar as lojas de pontos de venda de produtos em fornecedores de serviços e soluções.
Nova legislação e oportunidades
A entrada em vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em agosto de 2020, e seus impactos para o setor foram tema da fala de Renato Opice Blum, coordenador do curso de Direito Digital do Insper e sócio-fundador do Escritório Opice Blum. O advogado explicou o cerne da nova legislação: trazer mais segurança na coleta, processamento, tratamento e armazenamento de dados. Falou também da criação das figuras dos agentes de tratamento, do encarregado de dados e das bases legais para tratamento. [Leia nosso conteúdo A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o mercado de fidelização]
A lei cria direitos para os titulares e obrigações para as empresas, mas Blum enxerga novas oportunidades para todos: as câmaras de dados. “Existe espaço hoje para tratar e comercializar dados qualificados. Os usuários, nós titulares, serão remunerados por terem dados verificados. Companhias irão pagar aos titulares para ter acesso a esses dados e, dentro dessas câmaras, comercializá-los com empresas – ‘olha, tenho o dado X, valioso, certificado, é um perfil de consumidor do seu nicho’”. Esse potencial novo mercado de dados qualificados garantiria segurança para empresas e ganhos para os titulares.
Formação para a fidelização
Com quase duas dezenas de apresentações, esta edição do fórum tratou ainda de digitalização, super aplicativos e personalização, em setores tão distintos quanto os de fintechs e serviços de cuidados com animais de estimação, demonstrando o papel estratégico da fidelização. “Programas de fidelidade trazem benefícios para ambos: marcas e consumidores. Onde preços, produtos e serviços são quase os mesmos, é o relacionamento que fará a diferença. E, como brinco sempre, personalização é como vitamina D: eu não sei quanto preciso, mas quero sempre mais”, afirmou Claessen.
Paulo Curro, diretor-executivo da ABEMF, destacou o saldo positivo do evento e a importância de formação na área, com o anúncio do Workshop de Fidelização, que a entidade traz para o país em parceria com a Loyalty Academy. “O curso de dois dias será uma full immersion, onde abordaremos como construir um programa, modelagem financeira etc, numa grade pensada para o Brasil. Serão apenas 100 vagas, pois queremos uma maior interação palestrante-participante”. Em um mercado que possui mais de 130 milhões de clientes cadastrados – além do crescimento anual de dois dígitos -, educação será um diferencial para companhias e seus profissionais.