Com mais de nove horas diárias gastas na internet, os brasileiros estão entre os mais conectados do mundo. Sob quaisquer aspectos que se observe, o país hoje é uma nação digital, com mais de 120 milhões de pessoas com acesso à web. Mas, espelhando o “país real”, essa conexão é desigual. Condições de acesso, qualidade da internet e até apreensão do conteúdo ainda dependem de questões regionais, econômicas e sociais.
Isso produz oportunidades e desafios, pois não basta às empresas estar online, é preciso saber como atingir e interagir com o público-alvo. E quanto mais amplo este, mais complexa a tarefa. Este artigo reúne um conjunto riquíssimo de dados, de diversas fontes, que irá possibilitar aos tomadores de decisão gerar insights e traçar correlações e causalidades. Ao final, apresentamos alguns pontos sobre como realizar uma efetiva comunicação digital em um ambiente tão diverso.
Dispositivos eletrônicos e a comunicação digital
Com um potencial gigantesco, o Brasil ostenta, em qualquer setor, números de fazer inveja a países desenvolvidos. Lançada em maio, a 30ª Pesquisa Anual do FGVCia, o Centro de Tecnologia de Informação Aplicada da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, núcleo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP), traz um retrato do mercado brasileiro a partir de uma amostra de 2602 médias e grandes empresas, com resultados que “comprovam o processo de informatização e digitalização das empresas e da sociedade”.
A pesquisa aponta, por exemplo, que fecharemos 2019 com 420 milhões de dispositivos digitais (computador, notebook, tablet e smartphone). Temos uma base de 264 milhões de celulares ativos, sendo 230 milhões de smartphones. Isso em um país de 210 milhões de habitantes. São dados que corroboram as informações do recente relatório da consultoria McKinsey & Company (Brazil Digital Report): mais de dois em cada três brasileiros possuem smartphones e 71% deles usam seus celulares para acessar a web.
Smartphone, a nova roda
O Brazil Digital Report mostra também que estamos acima da média global (53%) no acesso à internet: 67% dos brasileiros, ou dois a cada três, estão conectados. Trata-se de uma população urbana (95%), majoritariamente jovem (25%, de 16 a 24 anos; 28%, de 25 a 34; e 16%, de 35 a 44 anos), com um leve predomínio feminino (53%) e, em geral, das classes AB (31%) e C (50%), com nível de estudo universitário (22%) e de ensino médio (49%) prevalecendo. Um perfil digital bastante heterogêneo.
Mas há um padrão perpassando todas essas faixas: a onipresença do smartphone. Daquelas mais de nove horas diárias online, quase a metade – 44% – acontece por meio de um desses aparelhos. Mesmo com diferentes condições de acesso entre as regiões do país ou utilizando-se de planos de dados econômicos (caso da classe C), o brasileiro vem consumindo muita mídia digital. E utiliza o aparelho também como ferramenta de contratação de serviços e compras, não só para redes sociais e mensagens instantâneas.
Alguns números de uma pesquisa sobre o uso dos celulares feita pelo site Mobile Time e pela Opinion Box, a Panorama Mobile Time, comprovam isso. Em dois anos, de 2017 a 2019, subiu de 46% para 58% a proporção de usuários que realizaram in-app purchases (IAP), as compras dentro de aplicativos. Isso se deve ao crescimento dos serviços O2O (online to offline), como IFood, por exemplo. Além disso, quatro em cada dez pessoas pagam serviços de streaming (de filmes), e dois em cada dez, serviços de música via celular.
Comércio eletrônico em alta
Quanto ao e-commerce em geral, os números também são crescentes. De acordo com o relatório da McKinsey & Company, em 2017, esse mercado movimentou quase R$ 48 bilhões, com 55 milhões de consumidores online. E a compra através de celulares representou 32% das vendas no varejo no ano seguinte. Já as operações de internet banking cresceram de 39 milhões para 118 milhões, entre 2013 e 2017, com a via mobile pulando de 12 milhões para 59 milhões, ou 58% de todas as transações bancárias.
Contudo, ainda segundo o Digital Brazil Report, esse comércio representa apenas 6% das vendas totais do setor no Brasil. Na Holanda e nos Estados Unidos, esses números somam 12% e, na China, 20%. À parte discussões sobre bancarização e aquisição de cartões de crédito, melhoria no acesso à internet e a dispositivos eletrônicos, a educação pode ser o elemento que irá ampliar o número de pessoas usufruindo de serviços e vantagens nas plataformas digitais. E nesse aspecto, o Brasil tem desafios dignos de sua dimensão.
Educação, um gargalo
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em junho, mostram que mais da metade dos brasileiros de 25 anos ou mais (52,6%) não concluiu o Ensino Médio. Apenas 26,9% têm Ensino Médio completo e 16,5%, superior completo (e 4% com superior incompleto). O quadro fica mais complexo ao se avaliar a Pesquisa de Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), da ONG Ação Educativa e Instituto Paulo Montenegro.
A pesquisa mensura o nível de alfabetismo da população entre 15 e 64 anos de todo o país, avaliando habilidades de leitura, escrita e matemática aplicadas ao cotidiano. O instituto classifica esses níveis em cinco faixas entre dois grupos (aqui já incluídos os resultados de 2018). Os analfabetos funcionais: analfabeto (7%) e rudimentar (22%); e os alfabetizados: elementar (34%), intermediário (25%) e proficiente (12%). É considerado analfabeto funcional quem, mesmo sabendo ler e escrever algo simples, não tem competências para satisfazer demandas do dia a dia e viabilizar seu desenvolvimento pessoal e profissional.
São considerados proficientes aqueles com capacidade de compreender textos e mensagens mais complexos, ironias, gráficos e projeções, além de diferenciar fato de opinião. Mesmo entre os alfabetizados, a proficiência é pequena. Comprovando que o país conseguiu universalizar o ensino básico, mas com um déficit de qualidade. Já o analfabetismo é, sem dúvida, um obstáculo para a vida – offline e online. Mas segundo a pesquisa, não um impeditivo: analfabetos funcionais são usuários frequentes de redes sociais: 86% utilizam WhatsApp, 72% estão no Facebook e outros 31% possuem Instagram.
Comunicação digital na medida certa
Como atingir esse público, de analfabetos funcionais a proficientes, é uma tarefa e tanto para a comunicação digital das companhias. Vídeos, GIFs e memes podem ser utilizados a gosto, mas lembrando que boa parte das pessoas faz uso de pacote de dados econômicos. Clareza e concisão são imperativos, em especial quando a plataforma é, quase sempre, o celular. As réguas de comunicação, além de relevantes, devem se pautar pela máxima “nem tão frequentes que irritem, nem tão esporádicas que mal sabe-se quem é”.
Outro fator a se levar em conta é a do aplicativo. Ele pode não ser uma solução para seu público – questão de espaço na memória ou uso de dados. Um levantamento da Google, de 2015, mostrou que 25% dos aplicativos são deletados após uma única utilização. Pesquisa da Adjust, de 2018, aponta na mesma direção, ao mostrar que a maioria dos apps são deletados depois de 5,8 dias, em média. Em resumo: o brasileiro está online, e adora cada minuto, mas as condições socioeconômicas variam enormemente. Seja direto e didático.
Em breve, o tema deste artigo será aprofundado em nosso programa de podcast, o Engajadores. Convidados especialistas na área irão discutir as perspectivas e obstáculos do universo da comunicação digital e oferecer dicas e insights. Para não perder o programa, assine nossa newsletter.