Todo programa de pontos, seja qual for sua moeda (milhas, estrelas etc.), acaba gerando um passivo, os pontos não resgatados pelos participantes. É natural haver essa breakage, desde que a taxa não seja alta (alguns especialistas cravam superior a 30% como um sinal de alerta). Mas há também formas estratégicas de lidar com esses “pontos esquecidos”: a tática de burning points. Trata-se de ações para incentivar os membros de um programa a resgatarem esses saldos, mesmo quando não há o suficiente para uma recompensa tradicional do catálogo.
Há várias maneiras de se fazer isso (veremos as principais neste texto) e duas razões essenciais: reativar os clientes desengajados do programa e reduzir a liability, isto é, a responsabilidade financeira adquirida pela empresa. Neste caso, ao emitir o ponto para o consumidor, o programa assume uma dívida, pois deve converter certo montante deles em benefícios.
A depender do regime fiscal de alguns países, a liability impacta os balancetes das empresas, pois entra como saldo a pagar (há até um estudo da Universidade de Stanford sobre como otimizar a relação de valor dos pontos/passivo). A tática de burning points é extremamente útil nesse sentido e válida até mesmo para programas cujos pontos possuem prazo de expiração, pois a validade reduz a liability mas não evita a breakage.
Até não muito tempo atrás, boa parte das companhias contava com o não-resgate de pontos como algo positivo (dinheiro poupado), mas essa visão curto-prazista tem sido deixada de lado, pois, no longo prazo, uma breakage alta indica falta de engajamento do público – ou seja, que a iniciativa de fidelização está falhando em gerar retenção e relacionamento.
Para ilustrar a importância de uma iniciativa de fidelização eficiente basta saber que um cliente que resgata recompensas é um cliente que retorna às compras. O relatório Global Customer Loyalty Report 2024, da Antavo, aponta que o gasto médio anual de membros que resgatam pontos é 3,1 vezes maior do que os que não resgatam. Contudo, o mesmo documento afirma que, em média, 49,8% dos pontos ganhos atualmente são resgatados – o que significa que a cada dois pontos ganhos, um está sendo perdido.
Outros levantamentos recentes também destacam esse desperdício. Uma pesquisa de 2023 da CreditCards.com indica que, somente nos Estados Unidos, 23% dos portadores de cartões que ofereciam recompensas não haviam resgatado nada no último ano. Um artigo da Harvard Business Review afirma que um terço dos pontos acumulados em programas de fidelidade norte-americanos são perdidos todos os anos por expiração ou outras regras de barreira.
A revista UCLA Anderson Review lembra que membros dos cinco mais populares programas de pontos de companhias aéreas norte-americanas deixaram, em 2020, o equivalente a US$ 27,5 bilhões em recompensas não utilizadas. Apesar de não haver um número consolidado sobre pontos não resgatados de programas de fidelidade, uma estimativa da Bond Brand Loyalty girava em torno de US$ 100 bilhões apenas nos EUA e Canadá.
Mas não se engane, o problema não são os programas de pontos. Eles são uma das ferramentas de fidelização mais eficazes e queridas do público. A terceira edição do Panorama da Fidelização no Brasil 2023, realizada pelo TSI e ABEMF (Associação Brasileira das Empresas do Mercado de Fidelização), prova isso, ao apresentar “Somar pontos”, com 31,4%, no top 3 entre as características de ações de fidelização que mais causam sensações positivas no público (em empate técnico com “Obter desconto”, 31,5%, e “Cashback”, 33,5%).
Por outro lado, o Panorama também mostra que 33,8% dos respondentes consideram que os benefícios das ações de fidelização oferecidas pelas marcas costumam ser difíceis de serem alcançados.
Isso ocorre, entre outros motivos, por mecânicas complexas, prazos curtos de expiração e falta de equilíbrio entre tempo x esforço despendido para acúmulo dos pontos. Uma baixa taxa de resgate também tem a ver com falhas na comunicação e recompensas não relevantes (saiba mais sobre como criar um programa de pontos relevante aqui).
Após eventuais correções no programa, as taxas de resgate, um dos KPIs mais importantes da fidelização, devem subir. Mas mesmo um programa bem desenhado terá breakage, e para minimizá-la a tática de burning points faz toda a diferença ao mesmo tempo em que reduz a liability do programa. Uma campanha direcionada para queimar pontos pode trazer de volta consumidores desengajados, além de mostrar atenção para com o cliente, indicando que a marca não quer que eles percam os pontos. Estas são algumas opções:
Uma última dica importante: customize sua tática de burning points. Todas as opções citadas acima são válidas e já foram ferramentas de sucesso em muitos programas de fidelidade, mas não devem ser simplesmente copiadas. Observe os objetivos do seu programa, conecte-os com a estratégia de branding da empresa (ou do projeto) e a partir daí defina qual a melhor ação implementar.
A tática de burning points deve ser planejada em longo prazo. Não é necessário esperar que os pontos “sobrem” para criar uma ação. No planejamento estratégico do programa, campanhas podem ser definidas de acordo com o calendário de marketing e objetivos da empresa.
Assim como em outras ações de Loyalty dentro do programa, uma boa solução é alinhar temas do core business às campanhas de burning points, como por exemplo ações de ESG. Lembre que uma campanha de burning points é uma oportunidade de falar com um público mais abrangente. É a chance de se comunicar com quem estava desengajado – mas uma oportunidade única para encantar e entregar valor a quem já conhece a marca.
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